Envolto
ainda na vaidade de conquistador do Peru apos sangrentos combates com os guerreiros de Ataualpa, decidiu
Francisco Pizarro, pelos idos de 1538, desvendar o <<pais da canela>>. Quis
saber da existência, em direção para o leste, para além- fronteiras do império
incaico, de certa <<terra rica em especiaria, que lhe dá o nome, e se
considera uma das mais preciosas do Novo Mundo>>.
As
tentativas de exploração dessa terra vinham desde 1533, com Pedro de Cândia e
Pedro Anzurey de
Camporredondo pelas margens do rio
Madre de Diós e do rio Beni,
tributários do rio Madeira. Alonso de Mercadelo chegou a fundar
Chachapoyo, enquanto Gomes de Alvarado descobriu o rio Hualhaga (O Rio Huallaga é um rio que
banha o Peru, sendo o principal afluente do rio Marañón).
Afeito
aos labores cotidianos – ele um bastardo impelido `a luta pela vida em plena
adolescência – pôs Francisco Pizarro para logo em execução a idéia lobrigada,
por intermédio de um irmão, Gonçalo Pizarro. Chamando este a Cuzco, aceitou o
convite sem relutância.
É
que influenciado pelas versões corriqueiras acerca da região distante, financiou
os próprios gastos as colunas destinadas `a grande aventura. Duzentos e vinte
homens recrutados, dos quais cem a cavalo. Entregues por inteiro `a empreitada,
nem dirigentes, nem subordinados puderam calcular as dificuldades por que iam
passar.
Ultimados
os preparativos da viagem, quer com relação a víveres, quer com referência ao
preparo do contingente humano, partiu a expedição rumo a Quitos. Estimada em
quinhentas léguas a extensão a percorrer. O perigo das matas totalmente
desconhecida desses indivíduos aventureiros, era sem duvida eminente, em breve
iriam enfrentar animais selvagens aos montes., como nativos armados de arco e
flechas em riste, que assaltavam em grupos arrasadores.
Penetrando
Quito, contornaram todos esses obstáculos, recebeu Gonçalo Pizarro o governo
das mãos de Pedro Puellas, substituto de Sebastião Benalcázar, havia pouco se retirado
dali. Em seguida, diligenciou no
reforço dos caravaneiros, mediante o aliciamento de habitantes das
proximidades.
A
essa altura dos acontecimentos,
entrou em ação o bravo
Fracisco Orellana, administrador de Guaiaquil. Com tanto ímpeto se vinculou ao
empreendimento – depõem historiadores – que até contribuiu com apreciável soma
em dinheiro. Meteu ombros, portanto, com a coragem que lhe era inata, com
recursos financeiros e a experiência que tinha dos anos já passados em contato
com a selva. A noticia de sua presença
foi motivo de justo regozijos. Todos consideravam valiosa a
aquisição, tanto mais quanto o
momento exigia que os postos de maior responsabilidades fossem confiados a
elementos assim, caldeados em duros trabalhos. Pelas credenciais apontadas, o
destino lhe iria reservar, conforme elucidação mais adiante, papel de relevo
como inexcedível condutor de homens.
A
partida da expedição saindo de
Quito, em dezembro de 1539. Verdadeira cidade em marcha como era natural
naquelas épocas - compara o grande
historiador amazonense e ex governador do Amazonas, Arthur César Ferreira Reis
– mais numerosa que as bandeiras paulistas dos séculos dezessete e dezoito.
Trezentos e quarenta soldados, dos quais cem montados fogosos cavalos, e mais
de quatro ameríncolas.
Mantimentos
`a vontade, conduzidos por homens e
lhamas. No rol de tais mantimentos, ovelhas e porcos em quantidade suficiente
para o abastecimento por vários meses. Experimentados sertanistas `a vanguarda,
inclusive Antonio de Rivera e João de Acosta, contando com terríveis
cães-de-caça.
No
devassamento das brenhas, em procura da riqueza ambicionada, os aventureiros
suportavam os piores reveses. Nas cercanias de Quixos, entre o Curaraí e o Napo, sofreram o assalto de
Tapuios, que ali predominavam. Superiores em armas, os expedicionários conseguiram por em fuga os nativos
donos daquelas terras, apavorados `a vista da barulhenta cavalgado dos bem adestrados cavalos.
Como
que em defesa dos aborígenes, a
natureza criou problemas aos castelhanos. Caíram chuvas torrenciais semanas a
fio, encharcando o solo e floresta. Desabamento de tendas deixando tudo
desabrigado. As tropas amedrontadas sem saber o que fazer aos sobressaltos, a
disciplina seriamente ameaçada. Animais e provisões para alimentação exposta ao tempo.
Homem
de ação, acostumado `as adversidades, Gonçalo Pizarro não capitulou, nem
permitiu fraqueza entre os comandados. No propósito inarredável de encontrar os
“bosques de La canela” – eí-lo mais revigorado que nunca, em busca da
especiaria tão sonhada. Agora,
entrava a fase mais delicada: a transposição dos Andes.
Fácil
de entrever o estado de espírito dos que
compunham a caravana em marcha, uma cidade em movimento. A selva quase
impenetrável, hoje sabemos que era e continua sendo impenetrável a grande e
verdadeira sela amazônica,
apresentando de quando em
quando uma surpresa. Caminhada
pelo sem – fim, onde dominavam flechas aceradas. Enxames de insetos como
pragas. Doenças tropicais que nem cientistas conheciam ainda, e até hoje em
século XXI não conhecem. Só
a ganância de descobrir terras e ouro etc... ou de servir a sua pátria,
ensejaria semelhante heroísmo.
Evidentemente,
não tardou a imposição de pesado ônus. Vultoso o número dos que tombaram em
plena refrega, vitimas do frio penetrante para o qual não estavam preparados.
Com os companheiros assim sacrificados – incumbidos da condução de gêneros
alimentícios e outras utilidades – os responsáveis pelo desbravamento se viram
na contingência de alijar quase toda a carga do lombo dos animais. Recurso
extremo, em situação realmente vexatória.
Perseguidos
assim pela doença, pela fome e pela fadiga, atacados pelos rigores do clima – da cordilheira andina ao povoado
Zimaco- alcançou – a Expedição, afinal, o “Pais da Canela”.
Entretanto,
não pôde ser mais desconcertante o
contato com a quimérica região.
Centenas de léguas percorridas em vão, em setenta dias, sempre ao calor do
mesmo entusiasmo. Arrancada de gigantes anelando apenas a revelação da
decantada arvore medicinal.
Apos
dois meses de busca improfícuas, em todos os ângulos da área visitada, achou
Gonçalo Pizarro de bom alvitre dividir a Expedição em dois grupos – um sob a
sua direção, e a outra `as ordens de Francisco Orellana. O primeiro com encargo
de permanecer por algum tempo nas verificações que se tornavam necessárias; e o
segundo para continuar a jornada, devorando distancias. Assim, de cenho carregado e olhos
vibrando energias, retomou Gonçalo
Pizarro os passos para a frente,
na esperança de encontrar o roteiro certo que o preocupava.
Dentro
em pouco, agravou-se entre os expedicionários o problema da alimentação.
Esfomeados e, pois, combalidos, perderam eles a noção do equilíbrio – muito
comum em quem fica perdido nas matas e que não costume de com elas
conviverem, a mente sem as
referencias costumeiras passa para o desequilíbrio levando o individuo a
loucura-. Devoravam cães e cavalos. Ingeriam chás de ervas desconhecidas, e
muitas vezes de qualquer folha, nas mais venenosas, e a imprudência custou o
sacrifício de vidas preciosas. Perto de duzentos homens morreram a míngua.
Dominados pelo medo e do terror, outros enlouqueceram.
Gonçalo
Pizarro, como todo chefe em momento desesperador, tomou deliberações
compulsórias. Impôs a disciplina a qualquer preço. Não deu trégua aos
selvagens, matando-os com a maior desenvoltura. Queimava-os sem piedade,
transformando-os em tochas humanas. Aos colaboradores, que faltavam `a verdade,
jogava-os vivos `a voracidade de cães famintos para serem devorados aos gritos
até a morte e ninguém os poderia socorrer era a lei imposta pelos estrangeiros naquela selva.
Acolhido
pelo cacique Dalicola, `as margens do Coca, acampou o indômito sertanista
durante dois meses, para refazer o animo dos que estavam sob seu mando. Foi anunciada, pouco depois, a
aproximação de Francisco de Orellana que, `a frente do escalão, no pais da canela , tentara desvendar, em
definitivo, o mistério das desejadas arvores, para exploração de qualquer
natureza. Não tinha sentido econômico a canela encontrada.
Aproveitando
a presença de todos os componentes da expedição – dos que acabavam de chegar e dos que com ele estavam naquele
lugar - promoveu Gonçalo Pizarro
importante reunião, na qual expôs,
sem evasivas, seu modo de pensar. Abriu a alma, falou sem circunlóquios e
solicitou opiniões. Dessa singular reunião, no centro da mata, resultou a linha
de conduta dos visionários: para a frente! 0 segundo os desígnios divino. Ficou
assentado, ainda, a construção de embarcações, com os recursos de emergências,
porque as correntes fluviais não
mais permitiam o avanço marginando o Coca.
O
preparo das embarcações ficou sob o critério do exímio entalhador Diogo Mexia,
com madeira extraída da selva. Material arranjado sem preocupação de
durabilidade. Pregos feito de fechaduras de malas e ferraduras de cavalos.
Calafetagem com resina de arvores e estopas de roupa velhas
Assim
conduzidas as coisas, dentro de poucos meses estava a frota em condições de zarpar. Alem dos soldados e
remeiros, grei Gonçalo de Rivera e frei Gaspar de Carvajal, cinco assistentes
religiosos. O segundo também investido das funções de escrivão.
Parte
por água – os doentes e cargas – e parte por terra, percorreram os escalões dos
reinóis muitas léguas, até que alcançaram um lugarejo, cujos nativos informaram
a existência, mais adiante, de farto manancial de viveres. `A semelhança, de
viajantes no deserto, que tudo sacrificam por um OASIS, os caravaneiros de
Gonçalo Pizarro viram na informação, fugidia e inconsistente, mais uma
oportunidade que se esvaía no transcurso dos dias.
Refletindo
num relance a gravidade do instante decisivo, e admitindo que o sofrimento deve
ter um limite, concordou Gonçalo
Pizarro na ida de Francisco Orellana `a vanguarda, nas embarcações, a
fim de providenciar sobre o problema do aprovisionamento.
Missão
conferida, claro, em termos bem compreensíveis. Confiança no companheiro que
vinha dando reiterados exemplos de pugnacidade. Por outro lado, conhecedor dos
meandros da hinterlândia, pelos anos de intensa atividade já sustentados, ninguém
melhor indicado para o desempenho da tarefa. Perspectivas baseadas no desejo de
todos tinham de sobrepor-se `as
asperezas da estupenda arrancada. Mas, se a ausência dos emissários se
prolongasse alem de oito dias – que tudo corresse sem alarde e sem vacilações,
<<por Deus e pelo rei>>.
Nenhum comentário:
Postar um comentário